quarta-feira, 28 de maio de 2014

O BWV 1056 por Andreas Staier na CdM


O cravista alemão vem tocar e dirigir peças de cravo neste sábado, na Casa da Música. Espero flutuar com o Largo do 1056 de Bach. Mas também haverá Georg Benda e Telemann, para terminar em festa.

Que a Staier lhe saia tão bem como aqui, na
Sonata BWV 968 :


Quanto a Benda, aqui fica - mas por C. Rousset - o esfuziante final do
concerto para cravo e cordas em si menor (1760) de Georg Anton Benda,
III - Allegro :


Cravo bem tocado assim, maravilha.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

O meu voto


Quero votar mas não tenho em quem.

À partida estão de fora os cinco do costume da nossa Assembleia. Pelo exemplo que dão e pelas propostas que têm feito, só em caso de ameaça imediata de ditadura faria das tripas coração para votar no establishment ou em saudosos de futuros cantantes. O meu amanhã, ontem, hoje e sempre, é a Europa, mas não parece lá muito cantante :( .  Por tabela, estão fora de causa POUS, MAS, LIVREs e tudo quanto fôr anti-europeu, declarado ou travestido em anti-euro.

Resta-me o quê ? O MPT ? Franchement. O Partido da Terra andou a fazer uma poluição sonora imperdoável à beira mar, e o candidato é um vaidosão. O PPM ? Se nunca fui monárquico...

E contudo, e contudo... que mal pode fazer um monárquico?

Nuno Correia da Silva é pró-europeu, culto e razoável, inteligente e preocupado com a falta de solidariedade e o desaparecimento da classe média. Defende, aleluia !, um Euro menos forte, desvalorizado, para dar hipótese aos países de economia fraca exportarem um pouco mais. Bom tipo.

E a realeza ? não me parece que seja objectivo da candidatura restaurá-la. Tendo em conta as feias ideologias que grassam, a monarquia nem é assim tão antipática, é uma fantasia inócua. Quem me dera estar numa monarquia rica e bem integrada na Europa.


Mas não, também não. Demasiado facilmente, o PPM resvala para um nacionalismo populista, serôdio e provinciano. E é um bocado queques. Pena.

Não tenho mesmo em quem :(((

Europa, linda Europa, não mereces isto.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

' JBL Pebbles ', uma bela prenda


Estou muito contente com as minhas novas colunas de portátil. Têm um som grande, cheio, e depois de bem colocadas (são esquisitas com a posição) dão um belo palco sonoro atrás do écran.

A posição certa é mais recuada que esta (está melhor a do lado direito), e levantada (sobre livros por exemplo) uns 3 ou 4 cm sobre a mesa.

Durante muitos anos , estive com uma Phillips que tinham um som muito limpo e focado, uns belos agudos, mas faltava-lhes corpo e sobretudo gastavam imensas pilhas AAA, pois não eram de ligar ao portátil por USB. Se não fosse o consumo de pilhas, nunca as trocava, gostava muito do som que elas davam:

As lindíssimas Phillips SBA

Experimentei algumas outras, com grande desencanto. Quando vi estas, com design original e com knowhow da Harman Kardon, pensei que deviam ser muito caras - arranjam-se por 60 €. Recebi-as de prenda :) ...


A princípio cheguei a ficar desiludido, parecia um som de "caixote" e desfocado. Falta um livro de instruções decente, cada vez mais raros, e nem sequer há manual online. Mas lá atinei com o sítio certo, e agora estou regalado. Em tempos de aperta-o-cinto, uma prenda que não podia ser melhor.


---------
Disclaimer: não sou accionista da JBL nem da Phillips :)

sábado, 17 de maio de 2014

Arvo Pärt sobre a questão da Ucrânia: Ucrainae Fratres


Soube pelo "The Rest is Noise" de Alex Ross que Arvo Pärt, o compositor estoniano, deu uma entrevista ao New York Times onde refere a acção de Putin na Ucrânia nos seguintes termos: "It cannot be called anything else but a crime.

Diz ainda Pärt,

I am very critical of Putin’s government and absolutely shocked about the latest events in Ukraine.” [Mr. Putin] “spread around him massive amounts of hostility and aggression, which has its own dynamics and can now only grow. You cannot take it back anymore. There is no control over it today.

Mais ainda o admiro.

Fratres, pois claro. Ucrainae Fratres.
Orq. sinfónica nacional da Estónia, dir. Paavo Järvi

terça-feira, 13 de maio de 2014

Bach segundo Siloti: prelúdio em Si menor


Provavelmente é a melhor obra que Alexander Siloti (1863-1945) compôs na sua carreira. Pianista russo, Aleksandr Ziloti de seu nome, nasceu em Kharkiv (actual Ucrânia) e estudou piano em Weimar, com Franz Liszt, e depois em Moscovo. No fim do séc. XIX fez uma reputada tournée pela Europa e pela América, e em 1901 conduziu a Filarmónica de Moscovo na estreia do nº 2 do seu amigo Rachmaninoff. Os concertos de Siloti eram eventos culturais muito frequentados e noticiados. Nomeado para o Teatro Mariinsky, os acontecimentos posteriores a 1917 levaram-no a emigrar para Londres e depois Nova Iorque.

Este Prelúdio é um arranjo para piano do BWV 855a de J.S. Bach, que figura no 'Pequeno Livro de Teclado' (W. F. Bach), e reutilisado pelo próprio no 'Cravo Bem Temperado'. Siloti transpõe o original de Bach da mão esquerda para a direita e desce de Mi menor para Si menor. O que em Bach era uma figura de 8 notas de fundo passa a ser enfatizado como linha melódica principal, na mão direita.O resultado é uma música mais melancólica e vagamente "repetitiva", que soa quase moderna, um pouco ao estilo de Einaudi ou Mertens.

Toca Robert Preston
:

Gravação histórica: Emil Gilels, romântico...

A partitura original, mas em piano, por Glenn Gould, seco:

Finalmente, o mais próximo do que Bach compôs, bem mais exuberante !



Em resumo: não conseguem deixar de brincar com a música de Bach. É uma tentação.

domingo, 11 de maio de 2014

Lamento pelos inúteis tanques de Kiev


Estou farto de pró-russos. Essa gente não mexeu uma palha contra a opressão estalinista nem se solidarizou com os checos invadidos que faziam frente aos tanques. Agora, eles que têm as costas quentes protegidos pelo exército russo, metem-se à frente dos tanques de Kiev porque sabem que é o lado 'fraco'. Hipócrita coragem a deles.

São os mesmos que, em Timor, se viam como Indonésios e preferiam o domínio indonésio à independência. Os mesmos que na Formosa desejam a soberania chinesa.

Kiev comete erros e tem alguns maus aliados; mas garante muito mais liberdade e dignidade que os separatistas submissos ao bruto aliado e saudosos do regresso da ditadura.

sábado, 10 de maio de 2014

Abandono, segundo Lawrence Durrell




(...) decidi passar os próximos anos neste lugar deserto - neste promontório queimado pelo sol. Rodeado de história por todos os lados, só esta ilha se conserva livre de qualquer referência. Jamais foi mencionada nos anais da raça que a possui. O seu passado histórico foi refundido, não no tempo, mas no espaço - não existem nem templos, nem túmulos, nem anfiteatros para corromper as ideias com as suas falsas comparações. Um renque de embarcações pintadas, um porto abrigado atrás das colinas, e uma pequena cidade abandonada pela negligência dos homens. É tudo.
... 
Nestas tardes de inverno, as vagas desencadeadas escalam a falésia e invadem os bosques de plátanos gigantes e selvagens onde costumo passear, uivando um calão brutal e inesperado, inundando e abalando os troncos.

...
Lá em cima, no céu, correm estrelas à desfilada. Antares, perdida naquela poeirada de nuvens (...) Abandonados os livros dóceis, os amigos complacentes, as salas iluminadas, as chaminés propícias às longas discussões, todo o universo civilizado (...)



L. Durrell, Justine (Vol I do Quarteto de Alexandria)


-----------------
Engraçado, é longe da feia e suja clausura de Alexandria que Durrell escreve algumas das melhores páginas. No regresso, em 'Clea' (vol. 4) ainda parece poder haver uma redenção: mas não, é mesmo a repelente cidade árabe de volta, com o estafado circuito do amor-sarjeta.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Excelência inclusiva: os mentirosos slogans educativos


Não sei se ainda é eduquês, mas o discurso ideológico educativo continua uma vigarice pegada.

Basta ver, nesta terça-feira, o suplemento "exlibris"  do Público, com a propaganda das escolas para atrair alunos.

O mais frequente é a "procura da excelência", o "compromisso com a excelência". Não pode haver espaço para tanta excelência em Portugal ! Acho que nem na Finlândia... Tanto mais que sabemos como foram formados os professores, na melhor das hipóteses na pobre mediocridade que reina por toda a parte. Mas mesmo que "procurem" excelência, ela será sempre um mito, de que só os extraordináriamente capazes e perseverantes se aproximarão. Nunca a excelência para todos, inclusiva, e logo na Trofa, ou em Albergaria-a-Velha ... o ridículo mata. Mas mata mesmo - como pode um ensino "de excelência" ser baseado na mentira ?

Outro slogan para risota e/ou indignação é a "cultura de rigor e mérito", tudo junto com a "inclusão", claro. A não ser que queiram salas vazias, só podem estar a mentir. E a "escola inclusiva, exigente e desafiante" ? Haverá maior inmpossibilidade no Universo ?

Um slogan em uso nas empresas da moda é "o sucesso dos clientes é o nosso sucesso". Pois eu gostaria que as escolas apregoassem "o insucesso futuro dos nossos alunos é o nosso insucesso". Isso sim, seria falar verdade.

Pelo menos, que passassem a publicitar uma escola que garante um nível mínimo "decente" para quem for capaz, se esforçar e empenhar - ou seja, que ao menos não se desperdicem capacidades -  já não era nada mau. E era bem mais credível.

Foi o que eu tentei sempre fazer. A "excelência" só pode vir por acréscimo - e com alguma sorte.



Tenho saudades tuas, Colin


A tua contida emoção, a tua musicalidade gloriosamente elegante, suave e espantoso milagre. 

sábado, 3 de maio de 2014

O Fagote (bassoon, basson)


Usado para o baixo contínuo na música barroca, e para reforçar os graves de orquestra desde o romantismo, o fagote é um instrumento de que pouco se fala e para o qual pouco se compôs. Tenho vindo a dar conta de que, embora seja limitado em riqueza harmónica e pouco versátil, pode ter uma sonoridade bonita, aveludada, que me apetece aqui realçar.

Fagote moderno

O fagotebasson, bassoon, fagotto) é um instrumento de sopro de madeira tocado através de palheta dupla, de fabrico exigente, requintado e raro, quase só fabricado na Europa (Alemanha e Itália). Os fagotes barrocos podiam atingir 3 metros, por isso rapidamente se dobraram em dois ligados por um tubo metálico, reduzindo o total a cerca de 1 metro e 30 (tubo duplo, total dois metros e meio).

Fagote barroco

Além do piano, o fagote é o único instrumento que exige, para ser tocado, a utilização de todos os 10 dedos. E não é fácil de segurar - pode tocar-se de pé, inclinado ou assente sobre um pedestal, ou a tiracolo, que é o mais frequente mas também mais doloroso para a nuca e as costas. Recentemente surgiram alguns suportes especialmente desenhados para fagote.

O enorme contrafagote barroco de Karl Nieler, na FCG. Os modernos dobram-se sobre si, como um 'clip'.

-------------------
Algumas obras:

Começo por Johann Friedrich Fasch, talvez quem mais e melhor compôs para fagote , como mostra esta elaborada sonata em Do maior, em fagote barroco.
Toca Sergio Azzolini.


Além de reforço do continuo,  o fagote era também muito usado no contraponto.
Telemann, no Concerto para 2 flautas e fagote, TWV 53:G1
[ em particular o Andante inicial e o Largo, aos 5:43 ] :

No fagote,  Lisa Goldberg.

De Mozart, que compôs para tudo o que se possa imaginar, é um dos raros concertos para fagote e orquestra, o KV 191. Vale a pena ouvir, deixo aqui Voltan Aligi no belo adagio :


De Johann Nepomuk Hummel, prolífico aluno de Haydn e de Mozart, o 1º andamento do seu concerto para fagote WoO23:

Dag Jensen no fagote.

De Beethoven, que também escreveu para clarinete e fagote, o delicado e muito lindo Romance para piano, flauta e fagote:


Também escreveram para fagote: J. C. Bach, Vivaldi, e até, imagine-se, Rossini, talvez por empatia de temperamento, como parece neste divertido Rondó do Concerto para fagote. De novo, Sergio Azzolini :


E de Verdi, este delicioso Capriccio per Fagotto !



Curiosamente, há muitas obras modernas e contemporâneas para fagote. Não cabem aqui, mas fica a referência ao

Concerto para fagote e cordas (III), de Sofia Gubaidulina: