quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Canopus: estrela, cidade egípcia e obra maior da Villa de Adriano


Na mitologia Grega, Canopus foi o piloto navegador do rei Menelau de Esparta durante as guerras de Tróia. De visita ao Egipto, morreu da mordedura de uma serpente, e foi homenageado com uma estátua junto ao mar, entre Alexandria e o delta do Nilo. Mais tarde, ali nasceria uma cidade que foi baptizada Canopus (*).


Porto importante da região, viria a ser, durante o Império Romano, um centro de produção de óleos e unguentos e local de prazer e diversão dos habitantes de Alexandria, a que Canopus estava ligada por um canal; lá existia também um famoso templo dedicado ao deus Serapis, uma invenção helenístico-egípcia do rei Ptolomeu I de Alexandria, que seria muito popular no Mediterrâneo sob domínio romano como deus propiciador de cura e boa saúde.

O nome Canopus foi atribuído também na antiguidade a uma estrela que, por acaso, não é visível da Grécia - mas já é, sim, do Egipto. É a segunda estrela do céu por ordem de magnitude, logo após Sírius.

Em 117 o muito viajado e culto imperador romano Adriano decidiu deixar Roma por um palácio enorme e ajardinado a construir em Tivoli (Tibur), uns 30 km a leste da capital. Entre 118 e 134, dirigiu a construção e foi replicando alguns modelos arquitectónicos que tinha visto nas suas viagens pelo Império; entre eles, a famosa piscina rodeada de um peristilo decorado com estátuas inspirada num templo famoso de Canopus, o Serapeum (dedicado a Serapis).

A Villa Adriana nasceu na terceira década do séc II. Toda a corte acompanhava Adriano no seu retiro, além de uma multidão de serventes, esses em residência permanente nos subterrâneos.

Percurso a pé desde a entrada até à Villa.

As primeiras paredes.

O Império era governado a partir da Villa por um serviço postal. Mas Adriano, adoentado, só habitaria este paraíso nos seus últimos quatro anos de vida (134-138 D.C.); depois dele, Marco Aurélio, Septímio Severo e Caracalla utilizaram também a Villa mas em regime temporário. E Zenobia, a raínha deposta da bela Palmyra, deve lá ter vivido nos fins do século III.

Sala dos pilares dóricos


Mosaicos do Hospital



A piscina e gruta denominadas Canopus e Serapeum, construídos antes de 132 D.C., tornaram-se desde início a atracção maior dos visitantes; a arquitectura é basicamente grega - colunas coríntias formando peristilo alternam com cópias de estátuas gregas - Hermes, Ares, Cariátides. O conjunto é de uma beleza genial e agora convida mais à contemplação do que à vida cortesã 'devassada'. O tempo apaga as feiuras, e sobra a elegância clássica entre cedros e pinheiros.

Quem leu Yourcenar percebe a minha teima em visitar a Villa, e a sua obra máxima, o Canopus :


Deis gratias ago, quase ninguém !

O rio Tibre, divindade fluvial. Canopus é o culto da água.

Ares (Marte).

Hermes , à esquerda.

Marte e uma Amazona.

O topo redondo a poente do espelho de água.

Cariátides.




Cenário de grandes recepções, entre banhos, massagens e banquetes, o Canopus obedece a uma situação privilegiada: protegido dos ventos pela colina a nordeste onde recebia o sol da tarde, soalheiro de manhã no lado sudeste, feérico à noite sob a iluminação dos archotes e com os reflexos da água nos mosaicos que cobriam o Serapeum, deve ter sido o luxo máximo da época que Adriano oferecia, a si e aos convidados.

As seis Cariátides no lado Sul.


Uma das teses sobre esta obra defende que reprenta o rio Nilo, e não apenas o canal de Alexandria.



Todas as estátuas são cópias de originais gregos; estas e outras estão do interior do Museu local.


Uma tarde há muito desejada !


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Quando penso que este é o mesmo Adriano, de curto reinado, que fez construir e visitou (122 D.C.) a muralha na Escócia, e em 131 D.C. esteve em visita de Estado a Palmyra na Síria, tenho vertigens histórico-geográficas. Numa época de lenta e difícil mobilidade, só a um homem extraordinário seria possível projectar-se em poucos anos numa extensão de espaço e tempo tão imensa.

Além da obrigatória leitura de 'Memórias de Adriano', há um nunca acabar de páginas sobre a Villa e o Canopus. Por exemplo, estes dois :
1. http://web.mit.edu/course/21/21h.405/www/hadrian/Hadrian's%20Villa/index.html
2. http://www.wikiwand.com/fr/Villa_d'Hadrien


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(*) Perto da actual Abu Qir (ou Aboukir), já se encontraram ruínas e espólio submerso de Canopus e do Serapeum:
      http://moco-choco.com/2012/10/08/sunken-civilizations-part-4canopus-egypt/

Nota: o chamado Teatro Marítimo, também belíssimo, a Casa dos Filósofos e outras partes da Villa estavam em obras de reabilitação, suponho que para o Jubileu que aí vem, e a visita era interdita. Azares.




1 comentário:

Gi disse...

Hehe também fiz uma visita "literária "...
Estive na Villa Adriana há tantos anos! E na Villa d'Este na mesma ocasião. Viu-a, Mário?
Tivoli era um local muito apreciado pelos Romanos na Antiguidade, ficava a uma distância muito conveniente da Cidade para ter uma residência secundária.